Tendo como trilha o fabuloso álbum do gênio Ney Matogrosso, Inclassificáveis, fico me perguntando como conseguimos ser tantos e tão diversos. Nos manifestamos de distintas maneiras e, ainda assim, há um troço visceral que nos une, nos torna brasileiros, nos torna latino-americanos. Inclassificáveis. Também somos assim. Somos de diversos jeitos, formas, cores. Somos a mistura perfeita do caos. Não há formas, há reentrâncias que dialogam em 3d, não somos pirâmide, somos árvore.
...Aqui somos mestiços mulatos
Cafuzos pardos mamelucos sararás
Crilouros guaranisseis e judárabes
Orientupis orientupis
Ameriquítalos luso nipo caboclos
Orientupis orientupis
Iberibárbaros indo ciganagôs...
A diversidade não deve ser vista de um ponto afastado, não pode ser vista sem a dimensão política. Nos organizamos, dialogamos, temos pontos em comum. Ao mesmo passo que a nossa forma de organização acaba por nos atingir de distintas formas. Não sou apenas jovem, sou mulher, sou militante, tenho um ponto de vista peculiar. Dialogo com as demais expressões, influencio e sou influenciada. Não há receitas ou fórmulas. Não sou mera consumidora, sou agente transformador, sou protagonista de minha história.
"... Teu sagrado e tua besteira Teu cuidado e tua maneira De descordar da dor De descobrir abrigo Entre tanto amor Entretanto a dúvida A música que casou Um certo surto que não veio..."
Não sei se falo de mim ou de você. Carrego no peito o frescor da tua presença, carrego na alma a capacidade de descordar da dor. Espero o certo surto que não vem, espero apenas. Descobri abrigo no teu afago, na tua beleza. Descobri a coragem dos que sonham. És meu anjo, minha flor mais bonita, o céu que exibe a noite de lua. É sublime apenas contar com a tua existência. Ainda não sei se falo de mim ou de você...
"... Há uma alma em mim, Há uma calma que não condiz... Com a nossa pressa! Com resto que nos resta Lamentavelmente eu sou assim..."
Me apaixono por algo que não existe, que não é material, que é deliciosamente fluido e displicente com as regras. Não é amar, não é amor... O cheiro que minha flor mais bonita exala é algo que transcende os meus sentidos, algo que me tira o eixo, algo que não sei onde começa ou termina.
"... Espero apenas que aceite o meu estranho amor..."
Sina Nossa, O Teatro Mágico Nosso estranho amor, Caetano Veloso
A atuação enquanto militante do movimento de Mulheres me faz ter vivências inexplicáveis. Estamos em um período fértil para a luta das mulheres. Óbvio que isto graças a muita luta, sangue e suor. Somos mulheres, fazemos sacrifícios pela nossa sobrevivência nesta sociedade heteronormativa, sexista, machista, racista. Desejam controlar nossos corpos e nossas vidas. Nos retiram a humanidade. Nosso corpo não nos pertence, nossos sonhos não nos pertencem. Sou mulher, estou viva e desejo viver os meus anseios de forma plena. Passaram a vida inteira me dizendo o que vestir, como me comportar, como devo me relacionar. Mas em algum momento eu fui consultada? Carrego em mim os traços do machismo, todas e todos convivemos numa sociedade machista. Mas há algo que pode nos diferenciar e que agrega para a luta pela superação deste modelo de organização social baseado na exploração do homem pelo homem. Não nego a perspectiva de classe, para mim não há feminismo sem socialismo, não há vitórias das mulheres e homens enquanto nosso modo de produção continuar a ter como horizonte a fragmentação das lutas e a expropriação das riquezas daqueles e daquelas que a produzem.
Tentam aprisionar nossas mentes... Não há nada que cause mais horror à ordem do que mulheres que sonham, pensam e lutam! Estou em movimento por acreditar na transformação real, possível, acredito no programa máximo! Desejo um mundo de eqüidade e fraternidade. Desejo a felicidade e o único caminho que aponta para este horizonte é o do socialismo, da luta, dos movimentos sociais e dos partidos de esquerda. Sou mulher, sou petista, sou kizombola. Sou aquilo tudo que me dizem e um pouco mais por conta própria.
A luta pela autonomia de nossos corpos e nossas vidas se dá nas microesferas das relações pessoais, assim como é reflexo de toda a superestrutura que nos aprisiona. Nossa luta perpassa o questionamento e superação deste modelo falido de cerceamento das mulheres. Somos violentadas, expropriadas, vulgarizadas, erotizadas e mercantilizadas. Nossos leões tomam proporções gigantescas. Sobreviver é, por vezes, a única saída.
Se lançar a sorte nas mãos de algum açougueiro é a única (quando existe!) saída para muitas mulheres. A iminência da morte e a certeza da solidão são as únicas companhias. Essas mulheres possuem rostos, cor, têm endereço nas periferias desta (e de outras) cidades. Essas mulheres têm idade, têm histórias, lágrimas e sofrimento. Um sistema que gera tristeza não dialoga com a idéia de igualdade e felicidade. Não neguemos o machismo, ele bate à porta em nossas caras cotidianamente.
Sou mulher. Estou viva. Enquanto houver sopro de vida estarei na luta pelo fim dos silêncios abismais, pelo fim da violência sem medida. Luto por um mundo de eqüidade e justiça. Não sou feliz neste sistema exploratório. Tenho sonhos banhados em sangue, tenho o sopro de vida daquelas e daqueles que doaram suas vidas em nome da luta. A estrada por onde caminho é antiga e carrega histórias de vitórias e derrotas. A mim cabe apenas lutar!
Nossa! Me assustei ao constatar que em setembro postei apenas 5 vezes por aqui... Minha assiduidade foi prejudicada pela prisão dos 140 caracteres do Twitter! Tudo bem que não é essa prisão toda, mas termina por matar a sede de me "amostrar" e tagarelar por aqui. Mas este é o meu jardim de sonhos e fantasias. Este é o meu canto!
Onde queres revólver, sou coqueiro
E onde queres dinheiro, sou paixão
Onde queres descanso, sou desejo
E onde sou só desejo, queres não
E onde não queres nada, nada falta
E onde voas bem alto, eu sou o chão
E onde pisas o chão, minha alma salta
E ganha liberdade na amplidão
E como tenho cantado à lua, ao mar, à primavera que tem enchido o meu peito de alegria! A primavera chegou e trouxe a brisa quente do verão. Meu jardim tem sido inundado por cores ainda mais exuberantes e por novas vidas e sabores. A minha flor mais bonita me deixa angustiada. Pareço o Pequeno Príncipe em sua paixão desmedida pela Rosa. Não nego os estragos mais deliciosos que ela me causa. Só ela faz meu peito apertar e minha alma se aninhar num afago quente. Só ela me coloca em conexão com os demais mundos que me regem. Com ela posso ser água, posso ser mato, posso ser raio e trovão. Minha flor mais bonita faz meus dias mais radiantes, faz o outono ter vida, faz a primavera brilhar ainda mais. Esta flor nasceu no verão e trouxe toda a luz, assim como todas as tempestades que vão e vêm. A amo e me rendo ao admitir que é ela que me inspira. Dela me deleito na doce seiva do querer, do desejar. É do som dela que faço minhas canções. É de sua luz que enxergo o dia.
Ah! Bruta flor do querer
Ah! Bruta flor, bruta flor...
Sei que meu jardim possui diversas espécies que detém minha atenção. Me surpreendo ao encontrar tanta vida neste pequeno espaço de meu ser. Tenho a vista de um mundo colorido e exuberante. Ele é dotado de contradições, de mágoas, de alegrias e de muita vida. Meu jardim não é alheio ao mundo que o cerca. Sou aquilo que vejo.
Onde queres o ato, eu sou o espírito
E onde queres ternura, eu sou tesão
Onde queres o livre, decassílabo
E onde buscas o anjo, sou mulher
Onde queres prazer, sou o que dói
E onde queres tortura, mansidão
Onde queres um lar, revolução
E onde queres bandido, sou herói
Por vezes escolho não ser heróica, admito que posso ser apenas humana. Posso errar, chorar, rir e enaltecer aquilo que penso. Meu jardim tem tomado conta da cidade que se desnuda diante de meus olhos curiosos. Me desnudo ao contar a estranho coisas que se escondem em minhas cavernas de entradas oblíquas. Apenas tenho a coragem de desvendar as cortinas de minha alma. Apenas abstraio esse mundo...
Eu queria querer-te amar o amor
Construir-nos dulcíssima prisão
Encontrar a mais justa adequação
Tudo métrica e rima e nunca dor
Mas a vida é real e de viés
E vê só que cilada o amor me armou
Eu te quero (e não queres) como sou
Não te quero (e não queres) como és
Trago no peito a iminência do choro. Não é pela lua cheia do céu, não é pelo mar que me aquietou a alma hoje, não foram os risos em mesa de bar ou as promessa que não se cumprirão. Apenas meu peito foi inundado por lágrimas que desejam libertar-se em meu jardim, elas desejam banhá-lo e alimentá-lo de tudo aquilo que meu coração guarda. Meus olhos as privam de sair, talvez compreendam algo que nem eu sei. Apenas aguardo a hora de libertá-las. Meus cavalos selvagens estão anunciando a tempestade. Nem meus olhos deterão a explosão da primavera.
O quereres e o estares sempre a fim
Do que em mim é de mim tão desigual
Faz-me querer-te bem, querer-te mal
Bem a ti, mal ao quereres assim
Infinitivamente pessoal
E eu querendo querer-te sem ter fim
E, querendo-te, aprender o total
Do querer que há e do que não há em mim
Minha flor mais bonita me confunde. Cada vez mais mergulho em seu universo. Ainda não sei onde estão os espinhos escondidos. Ela me jura que não os têm, mas meus olhos teimam em ver sombras de pontas afiadas. Meu coração berra por liberdade e toma a dianteira nessa expedição. Meu jardim não é para ser visto, é para ser sentido através de vibrações na alma. Meu jardim tem o perfume das cores e o gosto bom de manhã de domingo.